A Psicologia e a atualização da NR-1: orientações técnicas do CRP-MG

Setor Técnico de Orientação e Fiscalização do CRP-MG
Ref. Psicóloga Fiscal Claudia Regina – Subsede Sudeste

 

O Ministério do Trabalho e Emprego, por meio da Portaria nº 1.419 de 27/08/2024, alterou o capítulo 1.5 da Norma Regulamentadora nº 1 (NR-1), incluindo expressamente os fatores de riscos psicossociais relacionados ao trabalho no gerenciamento de riscos ocupacionais (GRO). Considerando que, no Brasil, os acidentes de trabalho em 2022, os adoecimentos por ansiedade, episódios depressivos e reações ao estresse grave e de adaptação somavam 8,35% dos adoecimentos ocupacionais, e figuravam no 2º lugar do ranking, perdendo apenas para a Dorsalgia (CID M54), conforme apontado no Guia de informações sobre os Fatores de Riscos Psicossociais Relacionados ao Trabalho.

A importância da atualização da NR-1 é explicitar as questões de saúde mental da trabalhadora e do trabalhador e as contribuições dos fatores psicossociais no adoecimento em ambientes de trabalho. Assim, em adição aos riscos à saúde já descritos em outras versões da NR-1 – riscos químicos, físicos e biológicos e de natureza ergonômica -, houve uma ampliação de forma a contemplar os riscos à saúde mental/emocional. Para tal, é exigido um trabalho de identificação, avaliação, gestão e monitoramento desses riscos, a fim de que os ambientes de trabalho sejam menos adoecedores para trabalhadoras e trabalhadores. E com a obrigatoriedade dos programas de monitoramento desses riscos, espera-se que diminua o crescente número de afastamentos por motivo de adoecimentos e afastamentos pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) – preocupação apontada pela Organização Internacional do Trabalho (OIT) e Organização Mundial de Saúde (OMS).

Há um grande trabalho a se fazer por parte das(os) psicólogas(os) neste campo, a fim de criar espaços de trabalho mais saudáveis, identificar riscos psicossociais e implementar programas que melhorem a qualidade de vida das trabalhadoras e dos trabalhadores. Pois não se trata de um novo campo de trabalho, mas de uma nova perspectiva de olhar e intervir, sobretudo, por parte da(o) profissional de Psicologia, ao se tratar de prevenção e promoção de saúde mental da trabalhadora e do trabalhador nas organizações.

A Psicologia e a NR-1: diretrizes ético profissionais – O Conselho Federal de Psicologia aprovou em 2023 a Resolução nº 14, que regulamenta o exercício profissional da(o) psicóloga(o) na realização de avaliação de riscos psicossociais relacionados ao trabalho, definindo em seu artigo 2º as atribuições, como as de investigar e diagnosticar características psicológicas das pessoas trabalhadoras, características dos processos de trabalho e do contexto organizacional que, de forma integrativa, interferem na subjetividade, na saúde mental, na integridade e na possibilidade de realização da atividade laboral.

A NR-1 vem tornar obrigatória a avaliação dos riscos psicossociais “relacionados ao trabalho”, por meio do gerenciamento no contexto da organização, em suas diferentes relações: de ambiente, clima organizacional, envolvendo trabalhadores, gestores, etc. Sendo assim, não há um enfoque em fatores individuais, mas propriamente organizacionais, em que é feita a avaliação situacional da instituição de trabalho, em interlocução com os diferentes atores. Esse é um contexto em que a integração da(o) psicóloga(o) à equipe multiprofissional é de extrema importância, considerando a especificidade de seu fazer: a saúde mental como fator de risco psicossocial.

Entende-se por riscos psicossociais, de acordo com o Guia de Informações sobre os fatores de Riscos Psicossociais Relacionados ao Trabalho, os fatores de perigo relacionados ao ambiente, características e condições do trabalho, que podem desencadear consequências ou agravos na saúde mental do trabalhador, sendo eles:

1. Assédio de qualquer natureza no trabalho
2. Má gestão de mudanças organizacionais
3. Baixa clareza de papel/função
4. Baixas recompensas e reconhecimento
5. Falta de suporte/apoio no trabalho
6. Baixo controle no trabalho/Falta de autonomia
7. Baixa justiça organizacional
8. Eventos violentos ou traumáticos
9. Baixa demanda no trabalho (subcarga)
10. Excesso de demandas no trabalho (sobrecarga)
11. Maus relacionamentos no local de trabalho
12. Trabalho em condições de difícil comunicação
13. Trabalho remoto e isolado

Ocorre que, com a obrigatoriedade de colocar em prática o programa de gerenciamento de riscos psicossociais, as empresas incumbidas de implementá-lo e escolher profissionais qualificados para tal, traz uma urgência de capacitações e reorganizações nos processos de trabalho, em curto período de tempo.

Com isso, o Sistema Conselhos de Psicologia se vê na responsabilidade de orientar a categoria e sociedade a respeito, a partir da Resolução CFP 14/23, Nota Técnica sobre o Assédio, Código de Ética Profissional, e a publicação da edição comentada da Resolução sobre riscos psicossociais realizada em 8/5/2025, a fim de evidenciar as diretrizes ético-profissionais, sobretudo de qualificação técnica profissional e responsabilidade social, tendo em vista a necessidade de uma prática ética, responsável e atenta às diversas formas de violência, agressão, discriminação, exclusão e demais riscos psicossociais que podem vir a acontecer no ambiente de trabalho, considerando que o contexto histórico-social também contribuiu para a cristalização de diversas formas de preconceito na sociedade (como por exemplo, a discriminação racial e étnica, gênero, deficiência e demais intolerâncias relacionadas aos grupos específicos), e essa discriminação/exclusão pode refletir e perpassar no ambiente de trabalho, potencializando alguns perigos psicossociais.

Por isso, cumpre ressaltar o compromisso ético, político e social da Psicologia quando trata-se desse assunto, uma vez que, em conformidade com o Código de Ética Profissional do Psicólogo (CEPP), a(o) psicóloga(o) deve promover a saúde e a qualidade de vida das pessoas e das coletividades, contribuindo para a eliminação de quaisquer formas de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão, bem como trabalhar em prol do respeito, liberdade, dignidade e garantia dos direitos humanos.

Ademais, torna-se imprescindível que a(o) psicóloga(o), em consonância com o CEPP, deve assumir responsabilidades profissionais somente por atividades para as quais esteja capacitada(o) pessoal, teórica e tecnicamente, e prestar serviços psicológicos de qualidade em condições de trabalho dignas e apropriadas à natureza desses serviços, utilizando princípios, conhecimentos e técnicas reconhecidas fundamentados na ciência psicológica, na ética e na legislação profissional. Ou seja, para a atuação profissional no campo em questão, é necessário que haja qualificação para tal e um respaldo técnico-científico na ciência psicológica.

Na mesma direção, é necessário que a(o) psicóloga(o) compreenda as relações de poder presentes nos contextos em que atua e os impactos delas sobre as suas atividades profissionais, posicionando-se de forma crítica e em conformidade com os demais princípios do CEPP. Ao identificar como as dinâmicas de poder podem sustentar ambientes laborais insalubres, a atuação não deve se reduzir a apenas identificar riscos, mas precisa estar comprometida com intervenções organizacionais que promovam mudanças culturais, fortalecendo políticas que assegurem ambientes de trabalho saudáveis.

Por fim, é importante comunicar e convocar as(os) psicólogas(os) para atentar-se a essa nova Norma Regulamentadora, evidenciando a importância do trabalho profissional da Psicologia para a realização da avaliação dos riscos psicossociais e promoção de segurança e qualidade de vida no trabalho quando trata-se da saúde mental dos trabalhadores.

Referências:

Guia de informações sobre os Fatores de Riscos Psicossociais Relacionados ao Trabalho

Resolução CFP 14/2023

Resolução CFP 23/2022

Código de Ética Profissional

Nota Técnica sobre Assédio

Live CFP – Edição comentada de normativa sobre riscos psicossociais nas relações de trabalho

Cartilha CREPOP – “Saúde do Trabalhador no Âmbito da Saúde Pública: Referências Técnicas para a Atuação da(o) Psicóloga(o)” (2019), que apresenta possibilidades de atuação da Psicologia no âmbito da Saúde do Trabalhador, atentando-se para as relações de poder existentes no mundo do trabalho na contemporaneidade.



– CRP PELO INTERIOR –