23 nov As relações raciais e a escuta na Psicologia foram debatidas no CRP-MG
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O Psicologia em Foco desta quarta-feira, 22/11, integrou o ciclo de debates “Consciência Negra”, que o Conselho Regional de Psicologia – Minas Gerais (CRP-MG) está realizando no mês de novembro. O tema debatido foi “Desafios da clínica: racializando a escuta”. Assista o debate na íntegra.
A psicóloga Tainã Vieira, co-fundadora da Rede Dandaras, falou do surgimento e da construção da Psicologia: “é um berço embranquecido, burguês, heteronormativo e classista”, contextualizou. A psicóloga também explicou que o fato do Brasil ser um país extremamente racista contribuiu para que essa ciência mantivesse tais princípios.
Formação e negação do racismo – Tainã relatou que no período da graduação em Psicologia não havia negras e negros no corpo docente. Os únicos funcionários negros desempenhavam funções como faxineiros e porteiros. “Isso mostrava que o meu lugar não parecia ser o de estudante”, relatou.
Segundo a psicóloga, a ausência de professores negros, também é um reflexo da falta de discussão sobre o racismo dentro no espaço acadêmico da Psicologia. Essa negação afeta a escuta das(os) psicólogas(os). “Como eu, psicóloga, não levo em consideração que a mulher negra é violentada de duas formas: uma por ser mulher, e outra por ser negra?!”, questionou Tainã. Ela ressaltou que o debate sobre o racismo e a consciência negra deve não só ser feito somente em novembro, mas sim, durante todo ano.
Rede Dandaras – Tainã Vieira e Laura Augusta são psicólogas e fundaram a Rede Dandaras em 2016, quando estavam na graduação. A Rede se articula como um espaço de fortalecimento contra o racismo institucional e aborda temas como: prevenção, promoção de saúde e fortalecimento de mulheres negras. “Ao participar do trabalho com as psicólogas negras, as mulheres negras ficam mais felizes e seguras, muitas dizem que precisam de uma psicóloga e que ela seja negra. É uma via de mão dupla”, explicou Tainã.
Os desafios das(os) psicólogas(os) negra(os) na Psicologia Clínica – A psicóloga, mestre em Psicologia Social, idealizadora e coordenadora do projeto “Espaço Bem Viver”, onde atua como psicóloga clínica, Rozangela Leite, falou das dificuldades da sua transição da Psicologia Social para Clínica, onde apontou que estes empecilhos já são evidentes na formação.
Rozangela Leite apontou três grandes desafios que profissionais negras(os) enfrentam na Clínica: o primeiro é sensibilizar psicólogas(os) brancos(as) e negros(as) sobre os impactos do racismo na saúde mental da população, o segundo é sensibilizar a população negra a ter acesso a este espaço e o terceiro é o papel da(o) psicóloga(o) negra(o) atendendo negros e brancos.
A psicóloga explicou que estes desafios ocorrem pela negação do racismo ainda na formação de base e, que profissionais negras(os) da Psicologia só discutem as relações raciais após a formação, e que mesmo assim é uma trajetória solitária para a maioria. “Foi passado para nós e está no nosso imaginário que a população negra é muito forte. O problema é que nós compramos essa ideia, mas que não é verdade. Se fossemos tão fortes os índices de moradores de rua, crianças abrigadas e famílias com problemas de organização social, não seriam ocupados por uma maioria de pessoas negras. Não somos fortes emocionalmente, nossa resistência é uma necessidade de sobrevivência”, afirmou a psicóloga.
Rozangela ainda falou dos lugares de fala e escuta e a ideia de termos uma sociedade em que as raças vivem de forma cordial. “Se o negro for falar das coisas que sofre por ser negro com um branco, ele não vai ser compreendido. Vai ser considerado como uma questão social e isso não é verdade, é o mito da democracia racial. Negros no processo de emancipação também sofrem racismo. O racismo não está só ligado a uma questão de classe e financeira”, afirmou a psicóloga.
Luciana Franco, psicóloga referência técnica do Crepop/CRP-MG, falou sobre a ação do Conselho Federal de Psicologia (CFP) que publicou neste ano o documento “Relações Raciais: Referências Técnicas para a Prática da(o) Psicóloga(o)”. A publicação foi elaborada no âmbito do Centro de Referência Técnica em Psicologia e Políticas Públicas (Crepop).
A mediação da mesa foi realizada pela psicóloga Luciana Costa, mestre em Psicologia Social, atualmente trabalha com atendimento clínico a adolescentes e adultos e integra a Comissão Psicologia e Relações Étnico-Raciais do CRP-MG.