Conselhos de Psicologia de Minas e São Paulo publicam caderno com orientações sobre atuação de psicólogas(os) junto a mães em situação de vulnerabilidade

Publicação é motivada por situações de retirada compulsória de crianças de suas mães

11 de junho de 2018. Belo Horizonte, Minas Gerais. Uma mulher se tranca com a filha de 1 ano e meio no quarto de um abrigo público. Ela se recusava a entregar a menina a estranhos. Do lado de fora do quarto, um forte aparato policial foi mobilizado. Homens do Batalhão de Operações Especiais (Bope), armados e encapuzados, deveriam pegar a criança e levar a outro abrigo, sob a alegação de que a mãe não teria condições de ficar com ela. Num cenário atravessado pelo medo e por ameaças, a mãe entende que não teria mais o que fazer, mas expressa o temor de entregar sua filha para um grupo em que só havia homens. Uma funcionária do abrigo se prontifica a acompanhar a menina no carro da polícia. E então a separação entre mãe e filha acontece.

A história foi relatada pela conselheira do Conselho Regional de Psicologia – Minas Gerais, Jéssica Isabel, nesta quarta-feira, 9/12, em live promovida em parceria com o Conselho Regional de Psicologia São Paulo. O relato chocante, infelizmente, ilustra uma situação que ocorre com frequência no Brasil. Em sintonia com este cenário, foi lançado durante a atividade o Caderno de Orientações do CRP-MG e CRP SP sobre a atuação de psicólogas(os) com mulheres/mães e suas/seus filhas(os) em situações de vulnerabilidade diversas.

Contexto – A psicóloga e integrante da Comissão de Orientação Mulheres e Questões de Gênero do CRP-MG, Jeanyce Araújo, recuperou uma análise da filósofa Angela Davis para explicar os casos em que mulheres/mães têm suas(seus) filhas(os) retiradas(os) pelo Estado. Angela Davis demonstra que a separação entre mães escravas e seus bebês era uma constante, ao mesmo tempo em que as mulheres escravas não eram consideradas mães, mas reprodutoras de mão-de-obra.

“Esse processo continua acontecendo, mas de outras formas. Como vivemos um apagamento histórico, às vezes, não temos essa noção”, destaca a psicóloga. Jeanyce relatou que a mobilização em torno do tema, em Belo Horizonte, ganha força no ano de 2014, quando a 23ª Promotoria de Justiça de Defesa das Crianças e Adolescentes emite duas recomendações. Elas estabeleciam que maternidades e profissionais da Atenção Básica de Saúde comunicassem à Vara da Infância e Juventude casos nos quais gestantes ou mulheres/mães façam uso de álcool e outras drogas ou estejam em situação de rua.

As recomendações provocaram reações em diversos setores, que se organizaram para discuti-la. O CRP-MG fez parte desse processo, por meio da Comissão de Orientação Mulheres e Questões de Gênero.

Situações semelhantes – A psicóloga na Defensoria Pública do Estado de São Paulo, Anna Carolina Cabral, relatou a mobilização em torno do assunto da separação entre mulheres/mães e filhas(os). Segundo ela, Minas Gerais se tornou uma referência no assunto e, em São Paulo, a organização em torno do assunto se torna mais sistemática a partir de 2016.

“O que nós vemos é que não se deve trabalhar só com o direito da criança ou o direito da mulher/mãe. É um direito ampliado, que deve ser considerado em conjunto. Além disso, sabemos que mulheres pobres e negras podem ter a maternidade impedida. Há gerações de mulheres que vêm sofrendo esses roubos institucionalizados”, analisa.

As participantes do encontro realçaram que a produção do caderno de orientações envolveu a participação de um grupo numeroso e diverso de profissionais e levou dois anos para ser concluída.

Acesse o material.

A live está disponível, na íntegra, a seguir:



– CRP PELO INTERIOR –