CRP-MG discute a despatologização das identidades trans

Cerca de 200 pessoas, entre psicólogos, estudantes e transexuais participaram, na noite desta quarta-feira (28/1), do debate “Psicologia e Direitos Humanos: Despatologização das Identidades Trans”. O evento foi promovido pelo Conselho Regional de Psicologia – Minas Gerais (CRP-MG) em parceria com o Centro Universidade UNA, em Belo Horizonte. A mesa de debatedores foi composta pelos psicólogos Felippe Lattanzio, Jaqueline Gomes de Jesus e Paulo Ceccarelli, e a condução dos trabalhos foi feita pelo conselheiro do CRP-MG, Túlio Picinini.

Ao abrir o evento, Túlio Picinini pontuou que o debate representava a parceria que o CRP—MG deseja fazer para trazer conteúdo e elementos de discussão, não só em termos políticos como técnicos, científicos e éticos. Por essa razão, disse ainda, que o Conselho vem promovendo essa mobilização da categoria e do meio acadêmico para trazerem sua contribuição e fortalecer os movimentos da sociedade organizada. “Dessa forma o assunto ganhará mais força e espaço. Temos que ter em mente que, mesmo diante das resistências e rejeições às identidades trans e outras diversidades sexuais, essa luta do movimento avançou muito nos últimos anos e ainda tem que avançar para refletir no reconhecimento de direitos, normativamente e judicialmente”, disse ele.

Antes de passar a palavra aos debatedores, Picinini convidou Dalcira Ferrão, também conselheira do CRP-MG, que anunciou a retomada do Grupo de Trabalho de Psicologia e Diversidade Sexual por parte do Conselho. “Por meio deste GT iremos pontuar a questão da despatologização, mantendo um diálogo constante com o movimento social LGBT e Transgênero”, esclareceu a conselheira.

População trans estimula a sociedade a refletir sobre o gênero

Logo após o anúncio feito pela conselheira do CRP-MG, o psicólogo e doutorando em psicopatologia Felippe Lattanzio iniciou as apresentações mostrando uma série de linhas teóricas sobre transexualidade. Segundo ele, muitos dos autores consideram a necessidade de cirurgia, “mas, sabemos que o que importa é como a pessoa se identifica. Todas as pessoas têm um nível de certeza quanto ao sexo, inclusive os transexuais. O problema é a descontinuidade entre um dado anatômico e a identidade. Por essa razão é que o que está em jogo não é ser reconhecido como homem, como mulher, e sim é o existir ou não existir. Isso é muito sério”, ponderou. Felippe concluiu sua apresentação afirmando que a psicologia e a psicanálise têm muito a oferecer e discutir, não em um papel de juiz, mas de estar junto ao transexual, buscando soluções mais satisfatórias para identidades mais flexíveis.

Jaqueline Gomes de Jesus, psicóloga, pós-doutora e autora do livro “Transfeminismo: teorias e práticas”, falou em seguida e utilizou uma série de fotos que ilustravam a segregação da sociedade para embasar sua apresentação. “A história nos mostra que a ideia de patologizar os outros pode levar ao genocídio. O Aparthaid, por exemplo, nada mais é que a definição de que somente o outro é humano. Entre os transexuais ocorre o mesmo. As pessoas têm que ficar se explicando como ser humano. Isso precisa ser desconstruído.  As pessoas trans estão ganhando visibilidade somente agora, mas ainda nem foi considerada humanizada”, advertiu ela. Jaqueline também mostrou, por meio de fotos, que a população trans não tem nem mesmo o controle sobre o próprio corpo, pois cada vez mais, quem não é trans vem fazendo uso da medicina para realizar modificações corporais, mas os transexuais precisam de autorização judicial. “A tutela sobre as pessoas patologizadas é muito evidente”, enfatizou. Ao concluir sua palestra, Jaqueline disse que a grande contribuição da população trans para a sociedade tem sido estimular a reflexão sobre o que significa o gênero.

Encerrou a fase de apresentações, o psicólogo Paulo Ceccarelli, autor do livro “Transexualidades”, que iniciou fazendo um breve histórico da sexualidade humana. Para ele, todas as mudanças aceitas pela sociedade foram uma decisão política. A reorganização social acontece quando todos passam a olhar o sujeito com outros olhares, fazendo uma outra escuta. “Infelizmente, vários profissionais não escutam mais o sujeito e tentam antes encaixá-lo em uma determinada teoria. Quando isso não acontece, ele é patologizado. As diversas sexualidades fazem o sujeito sofrer porque são uma afronta no que as construções têm até então dito sobre o masculino e o feminino”. Segundo Ceccarelli, a construção da identidade sexual é complicada e confusa, mas o discurso social está mudando.

Participação do público 

O público presente dividido em psicólogos, estudantes e transexuais participou ativamente do debate colocando perguntas aos palestrantes com o objetivo de aprofundar os temas apresentados. Ao final, Jaqueline Gomes doou um livro e uma camiseta para sorteio e cedeu sua obra “Transfeminismo: teorias e práticas” para o CRP-MG. A publicação já está disponível para consulta no Centro de Documentação e Informação Halley Bessa.



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