Dia Mundial da Saúde Mental: psicólogas(os) também precisam se cuidar

Profissionais enfrentam sobrecarga e condições de trabalho que impactam o bem-estar. Cuidar da própria saúde mental é parte essencial do exercício psi

No Dia Mundial da Saúde Mental, celebrado em 10 de outubro, muito se fala sobre qualidade de vida, conscientização e apoio a quem enfrenta transtornos mentais. Nesse contexto, o trabalho realizado por psicólogas e psicólogos ganha ainda mais visibilidade. O que nem sempre recebe o mesmo destaque é a saúde mental dessas(es) profissionais. Jornadas extensas, múltiplas responsabilidades, insegurança profissional e contato contínuo com o sofrimento alheio são fatores que podem afetar diretamente o equilíbrio emocional da categoria.

Pesquisa conduzida pelo professor Frank Dattilio (2015), do Departamento de Psiquiatria de Harvard, aponta que cerca de um terço das(os) psicólogas(os) já enfrentou ansiedade ou depressão, e até 40% relataram episódios de exaustão emocional no ano do estudo. A ideação suicida também aparece entre as(os) profissionais, um dado que reforça a urgência de atenção estruturada. Mas, afinal, o que seria saúde mental e como ela afeta o dia a dia das(os) psis?

Para a conselheira do CRP-MG Andressa Antunes, coordenadora da Comissão de Tomada de contas da autarquia, o conceito de saúde mental vai além da ausência de transtornos: “Está relacionada ao bem-estar, à forma como nos sentimos e pensamos sobre nós mesmos e o que vivemos. Não significa estar feliz o tempo todo, mas contar com recursos internos para enfrentar os desafios e manter uma sensação de equilíbrio e paz interior”, explica. Ela destaca também a importância do suporte externo: “O bem-estar fala sobre nós, mas também sobre o quanto podemos contar com uma rede de apoio que nos sustenta”, avalia.

Já o conselheiro Daniel Freitas, que está à frente da Comissão de meios de solução consensual de conflitos, acrescenta que a saúde mental está profundamente ligada à qualidade de vida, à saúde física e à resiliência. “Ter saúde mental é saber regular as próprias emoções, lidar com pensamentos negativos e conseguir se relacionar bem com as pessoas ao redor”, afirma.

Cuidar do outro e cuidar de si

A atuação na Psicologia envolve contato direto e contínuo com o sofrimento humano, um fator que pode gerar desgaste emocional. “Por mais profissionais que sejamos, entrar em contato com o sofrimento do outro é difícil: nos atravessa, nos afeta pessoalmente”, observa Andressa.

A psicóloga lembra que, no período pós-pandemia, houve um aumento expressivo na procura por atendimentos psicológicos, o que resultou em jornadas extensas, agendas cheias e desequilíbrio entre trabalho e descanso. “Essa demanda intensa sobrecarrega os profissionais, que muitas vezes acumulam funções e têm pouca pausa”, afirma.

O conselheiro Daniel Freitas reforça que as condições de trabalho e a ausência de regulamentação da psicoterapia estão entre os principais problemas que afetam a categoria. “As inseguranças inerentes a uma profissão liberal, somadas à exposição constante a conteúdos mentais negativos e à remuneração média baixa, tornam as(os) psicólogas(os) mais vulneráveis ao adoecimento”, observa.

Desafio extra

Entre as mulheres, que representam 79,2% da categoria de acordo com o Censo da Psicologia Brasileira de 2022, o impacto sobre a saúde mental tende a ser ainda mais acentuado. “Quando a mulher, além das demandas da profissão, também exerce outras funções, como o papel de mãe, a sobrecarga se torna maior e inevitavelmente afeta a saúde mental”, pontua a conselheira Andressa.

Ela destaca que essa realidade reflete uma estrutura social mais ampla, que impõe às mulheres a necessidade de comprovar competência e produtividade de forma contínua. “Para alcançar os mesmos espaços que os homens, as mulheres ainda enfrentam mais exigências e acabam acumulando tarefas da vida profissional e pessoal. Muitas abrem mão de necessidades básicas, como sono e descanso, o que compromete o bem-estar”, lamenta.

Autocuidado como responsabilidade profissional

Para as(os) conselheiras(os), cuidar da própria saúde mental é um compromisso ético e profissional. “Para cuidar bem do outro, o psicólogo precisa cuidar primeiro de si. Assim como no avião, quando é preciso colocar a própria máscara antes de ajudar o outro”, compara Andressa. “Esse cuidado é essencial tanto para que possam fazer um bom trabalho quanto para terem qualidade de vida”, complementa Daniel Freitas.

Entre os sinais de alerta estão o cansaço constante, a irritabilidade, a dificuldade de se desligar do trabalho, as alterações no sono e a perda de prazer nas atividades. “Buscar apoio antes que o sofrimento se torne intenso não é fraqueza, é responsabilidade”, alerta Andressa.

Compromisso do Conselho com a categoria

A psicóloga destaca que o enfrentamento desse cenário precisa combinar medidas individuais e institucionais. “O cuidado não pode depender apenas do esforço individual. É necessário que haja protocolos claros, ações preventivas e uma cultura organizacional que valorize o bem-estar. No nível individual, é importante que o profissional desenvolva consciência sobre seus próprios limites e sinais de desgaste. Isso inclui buscar espaços reais de descanso, ter momentos de autocuidado que não sejam vistos como luxo, mas como parte da rotina, e construir uma rede de apoio confiável, tanto pessoal quanto profissional. Mas também é essencial criar espaços de troca com colegas, porque compartilhar experiências e dificuldades ajuda a reduzir o isolamento e fortalece estratégias de enfrentamento”, defende.

Segundo a conselheira, o CRP-MG tem dado passos iniciais para compreender e fortalecer o cuidado com a saúde mental da categoria. “Estamos mapeando a realidade das(os) psicólogas(os) mineiras(os) e suas necessidades. A partir desse diagnóstico, será possível planejar ações mais estruturadas e efetivas para promover o bem-estar dos profissionais”, adianta.



– CRP PELO INTERIOR –