Entrevista: Conselheiro Anderson Matos comenta pesquisa inédita do CRP-MG

Ação convida psicólogas(os) mineiras(os) exporem conhecimentos sobre o uso terapêutico da Cannabis Sativa

O uso da cannabis surgiu há milhares de anos na China, de lá para cá, o emprego da planta tem sido, principalmente, na recreação. Porém, a medicina avançada já consegue identificar seus benefícios terapêuticos para além dessa função, como demonstram estudos da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto e da Associação Brasileira de Apoio Cannabis e Esperança. No Brasil, o estigma punitivo e social é dificultador de pesquisas e do amplo debate. 

Na vanguarda dessas discussões, o Conselho Regional de Psicologia – Minas Gerais (CRP-MG) lançou em julho, uma pesquisa para mapear o conhecimento de profissionais da Psicologia em Minas Gerais, acerca da Cannabis Terapêutica. Uma iniciativa conjunta com as(os) integrantes, da agora, Comissão de Orientação em Psicologia e Tratamento com Cannabis Terapêutica.

Para falar sobre essa iniciativa, o que esperar dela e a importância de debater o tema, convidamos Anderson Matos, psicólogo, professor, conselheiro e coordenador da Comissão do CRP-MG.

 

A pesquisa “O conhecimento da(o) psicóloga(o) mineira(o) sobre o uso da Cannabis Terapêutica” é uma ação inédita do CRP-MG. O que motiva a Comissão de Orientação em Psicologia e Tratamento com Cannabis Terapêutica, realizar a pesquisa e o que será feito após as respostas das(os) psicólogas(os)? 

A necessidade de fazer a pesquisa surgiu durante os trabalhos do G.T. sobre Cannabis Terapêutica, que precedeu a existência da comissão. Durante as atividades, percebemos que não havia nitidez de como as(os) psicólogas(os) percebiam a questão da Cannabis enquanto uma possibilidade terapêutica. Estamos fazendo essa pesquisa para entendermos se existem correlações entre gênero, raça e religião, por exemplo, que influenciam na percepção da(o) psicóloga(o) sobre o tema. Queremos identificar também a formação dessas(es) em relação ao tema álcool e drogas. É importante saber se a profissional foi qualificada para lidar com as demandas desse campo. O resultado da pesquisa compõe a publicação que o CRP/MG lançará sobre os trabalhos da Comissão.

 A partir do conhecimento gerado com a Comissão de Orientação, o que você espera de mudança no entendimento das(os) psicólogas(os) em relação à Cannabis? 

Gostaria muito que a classe tivesse ciência da realidade que se descortina no mundo em relação ao uso da Cannabis enquanto terapêutica e medicinal. Deveria ser uma questão ética da nossa profissão estar em sintonia com a realidade de pacientes e familiares que demandam Cannabis, contribuir para a desconstrução de preconceitos que rondam o tema, acolher de maneira adequada pessoas em sofrimento orgânico ou psíquico que precisam desses produtos e medicamentos. Pacientes que buscam a Cannabis terapêutica já percorreram um longo caminho para tomar essa decisão e precisam de nosso apoio, suporte e esclarecimento. Gostaria que um dia tivéssemos uma Psicologia Cannábica.

Existe um tabu relacionado ao uso terapêutico da Cannabis? O próprio termo terapêutico é uma forma de quebrar os preconceitos? 

Sim, existem vários tabus. Preferimos o termo terapêutico para irmos um pouco além da ideia do uso médico. O próprio termo ‘uso medicinal de Cannabis’ é certamente uma forma de transpor uma espécie de alinhamento que existe no imaginário popular, que compreende maconha como droga e, agora mais recentemente, Cannabis como medicamento. O discurso médico e da saúde tem reforçado essa ideia do ‘uso medicinal da Cannabis’ na expectativa de promover essa dissociação, que gera inclusive mal entendidos do tipo: CBD [Canabidiol] é o componente positivo, THC [Tetrahidrocanabinol] é o componente negativo, CBD é bom, THC é mau, mas certamente não é isso. Na verdade, Cannabis é Maconha e Maconha é Cannabis. Hoje parece exigir essa gourmetização dos termos para torná-los palatáveis à discussão pública. Preferimos o termo terapêutico por entender que não é um assunto exclusivo do âmbito médico. Terapêutico pode se estender ao uso adulto, diletante, ou simplesmente efeitos derivados que por suas características produzem situações terapêuticas. Tudo isso são campos para explorar.

Qual a importância das(os) psicólogas(os) debaterem o uso terapêutico da Cannabis Sativa L? 

Acredito ser uma discussão da qual não podemos nos furtar. O silêncio sobre essa discussão, tão atual e necessária, nos colocaria na posição de omissas(os) em relação à demanda de pessoas que sofrem. O protagonismo dos pacientes na cena brasileira sobre a regulamentação de produtos à base de Cannabis, sua luta, coragem e determinação, agindo muitas vezes no limite da lei, parece ser um convite que a categoria não pode ou não deveria recuar. Fazermos essa discussão é estarmos em sintonia, atentos e coerentes à realidade que nos cerca. 

Importante que todas(os) participem para termos um retrato fiel das dúvidas e dos saberes das(o) psicólogas(os) sobre o tema. Colabore enviando suas respostas através do formulário, acesse aqui 



– CRP PELO INTERIOR –