28 jun Entrevista: conselheiro apresenta Grupo de Trabalho de Inclusão de Pessoas com Deficiência, criado pelo CRP-MG
GT começa a atuar em junho e a participação é aberta a psicólogas(os) com deficiência
O CensoPsi 2022, levantamento realizado pelo Conselho Federal de Psicologia (CFP), revelou que 5,4% das(os) psicólogas(os) brasileiras(os) têm algum tipo de deficiência. Para conhecer melhor a realidade dessas(es) profissionais no estado, o XVII Plenário do Conselho Regional de Psicologia – Minas Gerais (CRP-MG) aprovou a criação do “Grupo de Trabalho de Inclusão de Pessoas com Deficiência”.
A primeira reunião do GT acontece nesta quinta-feira, 29 de junho, às 19h30, em formato híbrido: on-line e presencial. O encontro é sediado na subsede Norte do CRP-MG, em Montes Claros. O intuito é que as reuniões sejam itinerantes e aconteçam também em outras subsedes do Conselho. O grupo é aberto à participação de profissionais de Psicologia com deficiência e interessadas(os) podem obter mais informações junto ao Setor de Apoio às Comissões do CRP-MG, pelo e-mail: comissoes@crp04.org.br .
A coordenação do GT é realizada pelo psicólogo e conselheiro do CRP-MG, Ted Nobre Evangelista. Na entrevista a seguir, ele detalha os objetivos do grupo e relata como é exercer a profissão e ser surdo oralizado usuário de implante coclear.
Quais são os objetivos do Grupo de Trabalho de Inclusão de Pessoas com Deficiência?
O grupo tem como objetivo reunir e unir psicólogos e psicólogas com deficiência para a troca de experiências, acolher as necessidades de cada um, criar projetos e ações que garantam a inclusão das pessoas com deficiência na sociedade e nas atividades do Conselho. Também busca propor e consolidar orientações para a categoria no atendimento de pessoas com deficiência, assim como lutar pela implementação de políticas públicas de inclusão.
O que motivou o XVII Plenário a criar este grupo de trabalho?
Desde o plenário anterior tínhamos consciência da importância de criar um espaço coletivo para que pessoas com deficiência pudessem construir as pautas de inclusão, entretanto, devido à pandemia, tivemos que adiar este projeto. Retomamos neste plenário com muita expectativa de que ele seja bem acolhido pela categoria.
Quando o GT inicia os trabalhos e quem poderá participar?
O GT foi criado com o apoio de todas(os) as(os) conselheiras(os) que fazem parte deste Plenário. A partir da aprovação da proposta, iniciamos um trabalho de identificação de todas(os) as(os) psicólogas(os) com deficiência, convidando-as(os) a participarem do grupo. A primeira reunião está marcada para 29 de junho de 2023, às 19h30. A proposta é que as reuniões aconteçam mensalmente e esperamos fortalecer esse espaço coletivo.
Em vários campos, psicólogas(os) realizam o atendimento a pessoas com deficiência. O GT também pretende abranger o trabalho dessas(es) profissionais ou o foco é exclusivamente voltado para psicólogas(os) com deficiência?
Pretendemos abordar os dois focos. No primeiro momento, estamos preocupados em ouvir e entender as dificuldades da realidade de psicólogas e psicólogos com deficiência. Em seguida, a ideia é também preparar orientações para a categoria relacionadas ao atendimento de pessoas com deficiência, subsidiando a atuação por meio de materiais alinhados aos princípios da Psicologia como ciência e profissão.
Como psicólogo com deficiência auditiva, de que forma você avalia sua trajetória acadêmica? Como foi seu percurso formativo e quais potencialidades e dificuldades você identificou?
No meu caso, descobri uma doença degenerativa que afetou minha audição na fase adulta. Aos 38 anos, comecei a perder a audição progressivamente, passando a usar aparelhos de amplificação sonora individual (AASI). Com o avanço da perda auditiva, optei pelo implante coclear nos dois ouvidos. Então, quando me percebi deficiente auditivo eu já estava profissionalmente atuante na clínica e no ensino superior. Durante as etapas de diagnóstico, adaptação de aparelhos, cirurgia e fonoterapia tive muitas dificuldades para me manter ativo profissionalmente, principalmente em sala de aula. O apoio dos meus alunos e colegas professores foi fundamental para meu desenvolvimento. Entretanto, como surdo oralizado usuário de implante coclear, percebi que existia pouco apoio para lidar com uma nova forma de escutar, diferente da forma natural. Nesse percurso, foram necessários dedicação, estudo e também o entendimento sobre as potencialidades no processo de escutar novamente através das próteses. Hoje, como pessoa com deficiência, percebo que não existem políticas públicas adequadas para as crianças com deficiência usuárias de implante coclear no processo de ensino e aprendizagem no ensino básico, por exemplo. É preciso fomentar e criar projetos que preparem professores, psicólogos, pedagogos e outros profissionais para acolher e saber lidar com o processo de alfabetização e aprendizagem dentro da perspectiva inclusiva. O que me faz refletir que a sociedade ainda não tem conhecimento sobre as condições e as potencialidades das pessoas com deficiência. É preciso lutar pelos direitos de inclusão e proporcionar qualidade de vida para as pessoas com deficiência.
E do ponto de vista da atuação profissional: como o fato de ser uma pessoa com deficiência e ser psicólogo se refletem na sua atuação e no seu posicionamento?
Penso que o fato de ser uma pessoa com deficiência me permite falar das dificuldades, necessidades e superações com propriedade, somando ao grupo e à categoria com minhas experiências. A partir dessa condição, minha atuação passou a ser mais alinhada com a realidade das pessoas com deficiência, buscando construir uma Psicologia inclusiva, voltada para as necessidades e o cuidado com as pessoas com deficiência. Como consequência, conquistei novos espaços profissionais atuando diretamente com deficientes auditivos e, principalmente, sustento um posicionamento ativo e construtivo dentro do Conselho e na sociedade.
O Censo Psi2022 revelou que 5,4% da categoria possui deficiência. Na população geral, esse percentual é de 8,4%. Na sua avaliação quais são os desafios que a Psicologia enfrenta para atrair e manter pessoas com deficiência em seus quadros?
Entendo que temos três desafios dentro do atual contexto social. O primeiro passa por combater a lógica Capacitista que funciona como uma barreira para a inserção de pessoas com deficiência em ambientes vitais para o desenvolvimento social (escola, trabalho, comunidades e etc.). O segundo é o acesso ao mercado de trabalho, que muitas vezes não está interessado em adaptar-se às características e necessidades das pessoas com deficiência. Já o terceiro, é garantir espaços coletivos de ativismo das pessoas com deficiência para que possam participar das discussões que envolvem direitos e inclusão social. Para enfrentar esses e outros desafios, penso que é importante considerar a experiência da deficiência como um meio fundamental na construção de todas as práticas profissionais nas diversas áreas de atuação da Psicologia. Assim, poderemos expandir o olhar para contextos mais acolhedores das variações humanas e estabelecer ações equânimes que vão ao encontro com a perspectiva dos direitos humanos.