Tratamento com pessoas autistas para além da medicação, o que é possível fazer?

Psicólogas(os) dialogaram sobre os múltiplos autismos e as possibilidades de abordagem da condição durante live transmitida pelo canal do Youtube do CRP-MG

Os autismos são múltiplos e o tratamento também deve ser, medicalizar não é a única solução. Com essa perspectiva, as psicólogas Alice Oliveira Rezende, Cristine Nogueira e o psicólogo Igor Dutra Santos conduziram a live do Projeto Saúde Mental de Janeiro a Janeiro, nesta terça-feira, 26. A transmissão faz parte de uma série iniciada em 2021 pelo Conselho Federal e CRs. Nesta edição o tema foi: As práticas não medicalizantes no tratamento dos autismos. 

A psicanalista Alice Rezende fez um resgate histórico trazendo as referências médicas de Leo Kanner e Hans Asperger, pesquisadores de origem austríaca pioneiros no diagnóstico autista. Para Alice a distinção entre a noção de sintoma na ética psicanalítica e o diagnóstico científico são fundamentais para a atuação das(os) profissionais na atualidade. “Se o discurso científico considera [autismo] como déficit a ser curado, a psicanálise considera o sintoma a tentativa de cura, mesmo que fracassada. É uma tentativa de cura que o próprio sujeito constrói para lidar frente a situação de sofrimento”, aponta. Dessa forma, Rezende acredita que os comportamentos autistas clássicos como repetição, construção de circuitos e o receio da novidade se explicam por essa tentativa de se manter segura(o). 

“É claro que o nosso objetivo é introduzir o novo, ampliar os recursos desse sujeito, não é simplesmente concordar que elas(eles) façam sempre o mesmo e vivam uma vida como se todos os dias fossem iguais. Mas essa ampliação, como diz o Henrique Loran, deve ser suave. É uma forçagem, a gente vai ter que abalar essa estrutura rígida, mas com suavidade, aos poucos e respeitando as necessidades e aberturas que o sujeito autista nos oferece”, acrescenta Alice. 

Igor Santos trouxe uma visão semelhante a de Rezende, o psicólogo que adota a abordagem da Gestalt terapia falou sobre as questões relacionais e dificuldades que as pessoas autistas enfrentam no dia a dia. Santos elenca que muitas vezes a forma de lidar da(o) autista com estímulos desconhecidos é o comportamento estereotipado, formas criativas de lidar com a crise nem sempre aceitas pela sociedade mas que são acolhidas na Psicologia. “A Gestalt terapia sempre vai dizer para o terapeuta ir em contato com aquilo que o paciente oferece. Se o cliente oferece o contato de girar a roda de carrinho, a gente vai tentar participar disso, se aproximar dessa pessoa autista que está apenas com esse comportamento criativo, disfuncional, mas criativo. Ela(ele) inventa isso para dar conta daquilo que excede”, pontua. 

Essa aproximação entre profissional e pessoa com autismo, segundo Igor Santos, passa ainda por escolhas que abarcam as perspectivas da(o) paciente e não da sociedade normatizante.” Ao buscar o contato com aquilo que essa pessoa autista tem a oferecer, a gente não vai trazer as expectativas habituais do mundo, ao contrário do que a sociedade ampla faz”, avalia. 

“Eu acho isso muito rico na nossa profissão, parar de olhar somente para os pontos de desencontros teóricos e reconhecer que há pontos de encontro na compreensão dos fenômenos, dos sujeitos. Acho que isso é de uma preciosidade muito grande”, sinaliza a mediadora do bate papo Cristiane Nogueira ao falar das abordagens da Psicanálise e Gestalt acerca dos autismos. Nogueira também provocou o pensamento ao dizer de uma normalidade imposta que não abarca as singularidades. “Não necessariamente o que está posto para o funcionamento social, normotipo, é o que funciona para o sujeito. Funcionamento não necessariamente é funcional. Há um descompasso entre o enquadramento que a medicalização traz e a busca de uma existência funcional que permita o sujeito existir na sua singularidade”, instiga. 

Durante a live foram feitas diversas referências a filmes e livros, listamos abaixo:

 

Filmes: Tample Grandin; Life Animated
Livros: O Cérebro Autista: Pensando Através do Espectro, por Richard Panek e Temple Grandin; Olhe nos Meus Olhos por John Elder Robison; História em quadrinhos: A diferença Invisível por Mademoiselle Caroline.

A live na íntegra está disponível no canal do Youtube. 

Assista aqui:



– CRP PELO INTERIOR –