Live apresenta a história de beleza e resistência do desfile do 18 de maio

Resgate histórico do movimento revela que a ação coletiva é a garantidora de sua permanência por mais de 30 anos

Luta, potência, liberdade, alegria, política, resistência, beleza, coletividade foram as palavras mais proferidas durante a live “Liberdade Ainda Que Tan Tan: uma história de luta”, que o Conselho Regional de Psicologia – Minas Gerais (CRP-MG) realizou nesta terça-feira, 27, em seu canal no youtube. O evento fez parte da série Saúde Mental de Janeiro a Janeiro, que durante o ano todo propõe reflexões sobre a atenção em saúde mental de forma permanente, em todos os níveis de cuidado, com foco não apenas no indivíduo e suas subjetividades, mas em todas as coletividades.

Para poder contar essa história o Conselho convidou quem participou desde o início da construção do desfile do 18 de maio e continua ativamente na sua evolução: Eliana Moraes, terapeuta ocupacional, trabalhadora das Redes de Saúde Mental de Belo Horizonte e Ribeirão das Neves; Marta Elizabete de Souza, psicóloga e mestra em Medicina Social, militante da Luta Antimanicomial; e Paulo Azevedo, jornalista e usuário da Rede de Atenção Psicossocial de Belo Horizonte (RAPS-BH). A live contou com a mediação da conselheira Lourdes Machado.

Ao abrir a live, Lourdes Machado explicou que o desfile do Dia Nacional da Luta Antimanicomial é um espaço importante, que leva para as ruas cerca de 4 mil pessoas todos os anos. “Estamos aqui hoje para mostrar como ele é produzido. Costumamos dizer que o 18 de maio começa em fevereiro e é para contar um pouco disso, ressaltando esse rapel da arte na promoção do bem-estar psicológico e na celebração da resistência ao manicômio, que estamos aqui hoje com três pessoas fundamentais. Nossa luta é fazer com que a sociedade entenda que todas as pessoas podem circular livremente pela cidade e serem cuidadas em liberdade”, relatou.

A psicóloga Marta Elizabete iniciou a fase de exposições contando que o movimento da Luta Antimanicomial e tudo que se relaciona a ele foi criado durante o segundo congresso dos trabalhadores de saúde mental realizado em Bauru, em dezembro de 1987. Segundo ela, inicialmente a data seria comemorada dentro das universidades, por meio de seminários que dialogassem sobre o cuidado em liberdade, mas desde o início o movimento estava ciente da necessidade de se mostrar para a sociedade. “No ano seguinte os núcleos formados em Bauru começaram a desenvolver atividades no 18 de maio, pelo país. Aqui em Minas, a primeira que fizemos em parceria com o CRP-MG – que sempre esteve presente nessa luta – foi um seminário no auditório da escola de economia da UFMG para analisar o filme argentino ‘O homem que mira para o sudoeste’. Em 1989 fomos para a praça Sete, no centro de Belo Horizonte, realizar oficinas de bonecos, teatro e pintura. Algo bem ousado para a época. E nos anos subsequentes começamos a fazer o 18 de maio saindo da porta do hospício, do Instituto Raul Soares, que foi muito simbólico”, relatou Marta que complementou contando que em 1997 foi formalizada a escola de samba Liberdade Ainda Que Tan Tan: “é muito sofisticada e bonita a evolução desse trabalho coletivo que continua se transformando”.

Eliana Moraes continuou a história revelando que a partir de 1998 o movimento decidiu fazer desfiles temáticos, mas mantendo o tom politizado e cultural sobre o que é uma sociedade sem manicômios, com músicas elaboradas pelos usuários de saúde mental. “As reuniões ocorriam nas instalações do CRP-MG. Tudo de forma coletiva, militante, com reflexões sobre o que era mais urgente no Brasil e no mundo, buscando sempre uma sociedade sem manicômios e também com respeito, saúde, educação e lazer”, relembrou. Em 2005 o movimento adotou o concurso para escolher a música pois a cada ano aumentava a produção artística. Desde a pandemia passaram a fazer as reuniões de forma virtual e mantiveram porque segue possibilitando que mais municípios participem. “Nessa evolução do 18 de maio passamos também a fazer concurso de mestre sala e porta bandeira e para as alas infantis, o da princesa e do príncipe. Essas viabilizaram a existência de um grande evento dentro do evento do 18 de maio, que acontece em abril”, pontua a terapeuta. O processo de elaboração do desfile parte de diálogos sobre a conjuntura que mantenha o viés político, cultural e colaborativo.

Para encerrar a contextualização proposta pela live, Paulo Azevedo revelou que aderiu à Luta Antimanicomial em 1995 por se encantar com a logomarca da escola de samba Liberdade Ainda Que Tan Tan. “Outra coisa que me tocou bastante foi o tratamento das profissionais conosco porque no manicômio não somos bem cuidados. E quando a gente pergunta o que temos de mais genial eu digo que é o centro de convivência, mas sabe quem o inventou? Não existe essa pessoa. É fruto da coletividade. É uma incubadora de vida porque lá dentro acontecem muitas oficinas, nascem coletivos para ganhar autonomia e ganhar a cidade”, ressaltou. O jornalista e usuário contou que dentro dos centros de convivência acontece toda a preparação das fantasias para o desfile e que isso possibilita entender melhor o que é a luta antimanicomial. “Por causa da luta passei a me aceitar do jeito que sou, assumir a loucura. Esse é o lugar da luta e reivindicar um lugar na sociedade. É uma catarse também. Vejo agora que está ocorrendo um movimento da emancipação da loucura”, finalizou.

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– CRP PELO INTERIOR –