Psicologia é convocada a pensar soluções para o genocídio da juventude negra em evento do Conselho

“Possibilidades de existência da juventude negra: em que a psicologia pode contribuir?” foi o tema de debate desta quarta-feira, 6, no Conselho Regional de Psicologia – Minas Gerais (CRP-MG), em Belo Horizonte. Foi a primeira edição do Psicologia em Foco de novembro inaugurando a programação especial “Relações Étnico-Raciais”, ou seja, todos os eventos desse ciclo, neste mês, abordarão os racismos.

O encontro contou com as(os) convidadas(os) Giovanni Silva, psicólogo na Casa de Semiliberdade São João Batista e  integrante da coordenação da Comissão de Psicologia e Juventudes do CRP-MG; Laura dos Santos, psicóloga clínica, especialista em Terapia Cognitivo Comportamental, integrante da Comissão de Psicologia e Relações Étnico-Raciais do CRP-MG; e Matheus Ferreira, estudante de  Direito, atua no apoio pedagógico ao educando com deficiência, transtornos de comportamento e altas habilidades (MGS). Mediou os debates Aline Alvarenga, psicóloga, especialista em Cidadania e Direitos Humanos, que atualmente trabalha na rede de saúde mental.

Na perspectiva do encarceramento da juventude negra e seus entendimentos sobre os efeitos na subjetividade desses jovens, Giovanni Silva desenvolveu sua apresentação, já que possui um histórico de atuação nas medidas socioeducativas. Como principal função do seu trabalho indicou o auxílio aos adolescentes para acessar seus direitos. “Muitos chegam desesperançados, acreditando que sua vida será curta. Isso é muito impactante para nós. Neste momento temos que mostrar que existe uma oferta de oportunidades de aprendizado, de formação profissional que eles desconhecem completamente. Nem imaginam onde encontrar”, relatou.

Ele exemplificou alguns estereótipos que a sociedade alimenta em relação a esses adolescentes que cumprem ou cumpriram as medidas socioeducativas: “o menor de idade delinquente não sofre nada. Como dizer isso sem conhecer a realidade extremamente punitiva da internação? Ou que o dinheiro do tráfico é fácil de ganhar. Para muitos é um tipo de trabalho escravo, exaustivo. E ainda há uma tendência muito forte de achar que esse jovem não tem família. Grande parte tem e ela necessita de cuidados”. Para finalizar, Giovani Silva ressaltou que a Psicologia tem como principal função retirar esse adolescente do que chamou de “movimento de massa”, entendendo sua singularidade.

Novas narrativas – Laura dos Santos falou em seguida sobre a capacidade da juventude negra de pensar além das possibilidades de resistência. “Ela tem construído novas narrativas para mostrar que existe além dessa ideação da marginalidade, esse não lugar do jovem negro do tráfico. Temos que olhar para essa ressignificação que os jovens têm feito de pertencimento dos lugares, de sua posição social, da música e até mesmo da construção da mulher negra com seu lugar de fala no Rap”, explicou defendendo ainda que é preciso perceber a cultura, a moda e a arte, de modo geral, a partir de uma estética negra, já que os jovens vêm usando seu estilo como um posicionamento.

“A psicologia tem que perceber tudo isso e ter um olhar crítico. Nossa comissão dentro do CRP-MG tem feito isso, pensando e produzindo a partir da construção estrutural da sociedade. Acreditamos na necessidade de uma escuta racializada da clínica, já que tantas dores advém da negação social em função da cor. Quando não se atinge a porta do emprego ou da saúde isso também é um genocídio”, enfatizou a convidada do Psicologia em Foco. Para finalizar convocou a juventude para os debates com o intuito de construir melhor as formas do fazer psi e citou com fontes fundamentais para o trabalho das(os) psicólogas(os) a Resolução CFP 018/2002 e a publicação “Relações raciais: referências técnicas para a atuação de psicólogas(os)”.

Permanecer viva – O último convidado a falar no evento foi Matheus Ferreira, que primeiro apresentou um rap de sua autoria e depois convocou a plateia a pensar no quão “lamentável é falar de possibilidades de existência da juventude negra, de permanecer viva”. Para ele isso mostra como a Constituição Federal não funciona, já que em seu texto, no artigo 5º, está assegurado o direito à vida.

“Se me perguntam o que a psicologia pode contribuir eu digo que é ir além de dizer para os jovens que roubar e traficar é errado. Isso eles já sabem. É preciso ajudar com afeto e respeito”, definiu o estudante de Direito. Alertou também para a urgência de priorizar as crianças, pois é nessa idade que se acessa a criminalidade e o que precisam é ser compreendidas: “elas assistem diariamente suas famílias serem desrespeitadas e acreditam então que ser bandido é conseguir esse respeito. Que cada um pare de fechar a janela do carro e não defenda discursos de ódio. Temos que falar de genocídio da infância negra, da infância periférica”.

Por fim, Matheus Ferreira disse que um dos principais fatores que tem afetado a existência das crianças e adolescentes negros é a depressão nos mais diversos âmbitos, desde o relacionamento difícil com a família, os abusos físicos, sexuais e psicológicos às mágoas amorosas.

Assista ao registro do evento:



– CRP PELO INTERIOR –