Racismo é debatido no Psicologia em Foco

O penúltimo Psicologia em Foco deste ano aconteceu nesta quarta-feira (2/12) e teve como tema a “Sociedade e racismo – problematizações à luz da Psicologia”. O Conselho Regional de Psicologia – Minas Gerais (CRP-MG) está promovendo este ciclo de eventos semanalmente com os objetivos de discutir os temas que afetam diariamente a profissão e mostrando a grande abrangência da atuação do psicólogo na pauta diária da sociedade. Clique aqui para ver as fotos do evento.

As convidadas foram as psicólogas Luciana Costa, mestranda do programa de pós graduação em Psicologia (Fafich/UFMG) e Luanda Queiroga, integrante do Grupo de Pesquisa Memórias, Representações e Práticas Sociais. A coordenadora da mesa foi a psicóloga integrante da Comissão de Direitos Humanos do CRP-MG, Débora Matoso.

Luciana Costa iniciou sua fala definindo racismo pelo autor Lima & Vala e usou seus conceitos durante a apresentação. “O racismo constitui-se num processo de hierarquização, exclusão e discriminação contra um indivíduo ou toda uma categoria social que é definida como diferente com base em alguma marca física externa, a qual é re-significada em termos de uma marca cultural interna que define padrões de comportamento.” Segundo ela, o racismo é mais que uma discriminação e mais que um preconceito porque trata de hierarquização e de exclusão social.

Negação do racismo –A psicóloga relatou que de acordo com Lima & Vala, o racismo é um problema do outro, na qual as pessoas não se classificam como racistas, mas acreditam que o Brasil sofre com isso. “Quando negamos que somos racistas não nos movimentamos contra e precisamos nos mobilizar. Se nos consideramos uma sociedade racista, somos racistas também. Porém, é difícil nos enxergarmos como tal. Se reconhecer como racista não é um processo fácil, mas enquanto negamos continuamos reproduzindo esse preconceito. Só podemos mudar quando aceitarmos o que somos”, declarou.

Em relação às leis contra o racismo, Luciana afirmou que mesmo sabendo que se trata de crime, muitas vezes os casos são confundidos com injúria racial. “Isso acontece porque o racismo é considerado mais grave pelo legislador, além de ser imprescritível e inafiançável o que não acontece com a injúria, na qual além da pena se tem multa”, relatou.

Luciana também comentou sobre as novas formas de racismo. “São maneiras em que se pratica o ato, ofende a pessoa e no fim fala que é brincadeira. São formas por meio de piadas e ditos populares, por exemplo. É o chamado racismo codial”, explicou. Ela ressaltou que o problema por trás disto é a piada que vira agressão e se transforma em morte. “O racismo brasileiro não está escondido e temos toda a certeza que ele mata a população negra. Podemos analisar isso pelo próprio Mapa da Violência de 2015, que mostra como o índice de homicídios de mulheres brancas caiu enquanto o de mulheres negras aumentou”, falou.

Para concluir, Luciana Costa disse que as mulheres negras resistem ao racismo e na medida em que ele vai mudando as formas de resistência também vão, como a 1ª Marcha das Mulheres Negras, que aconteceu no dia 18 de novembro de 2015, com o lema ‘Contra o Racismo e a Violência e pelo bem viver como nova Utopia’.

As várias Iemanjá’s – Luanda Queiroga abriu sua fala dizendo que a história da sociedade brasileira ser calorosa e acolhedora é na verdade um grande mito, pois o Brasil é sim um país racista. “O racismo está escondido no cotidiano e já nas redes sociais está sendo escancarado, talvez porque as pessoas tem medo de falar pessoalmente e usam as redes para expressar o que pensam. Com isso, as denúncias também tem aumentado por causa desses casos, mas ainda sim o racismo é algo escondido e nas religiões de matriz africana sempre se teve esse preconceito”, declarou.

A psicóloga também realizou sua apresentação baseando na sua tese de mestrado sobre Iemanjá “Um estudo em Representação Social e religiões afro-brasileiras – Senhora das águas e da canção: Iemanjá na música popular brasileira (1933-2014)”.

“A questão é se há um preconceito contra as religiões e seus orixás, porque Iemanjá que também é uma orixá, é bem aceita na sociedade brasileira?”, questionou, ela pontuando que a conhecida rainha dos mares virou uma representante brasileira e que ao longo foi perdendo suas características africanas. “Na África, Iemanjá era negra e uma grande mãe representada como uma mulher com grandes seios apoiados nas mãos. No Brasil, na concepção religiosa, ela é rainha e divindade do mar e na concepção popular, uma bela sereia e uma mulher sedutora”, detalhou. Luanda ainda disse que Iemanjá se adequa a cultura brasileira. “Ao mesmo que ela está sendo aceita, está sendo popularizada de uma forma autônoma. Ela não faz parte de uma religião brasileira e nem de uma africana, é representada de várias formas, que se aproxima da cultura ocidental”, falou.

Luanda completou dizendo que de acordo com Ortiz(1978) e Prandi (2005), percebe-se que alguns elementos da cultura de origem africana ainda têm sobrevivido nas letras de canção na medida em que a marca da origem negra é disfarçada ou apagada e isso apenas acontece porque se tem o racismo, como em frases “somos todos os humanos”, “Dia da Consciência humana”, “negra de beleza exótica ou com traços finos”.

Para finalizar, a psicóloga relatou que as consequências do racismo podem ser psicológicas, de acordo com estudo publicado online no Journal of Counseling Psychology. “O sofrimento de vítimas de racismo se assemelha a vivência de situações traumáticas. É a mesma de quem presenciou um acidente e o racismo afeta diretamente a saúde destes sujeitos. Os pesquisadores salientam que os terapeutas de pessoas negras devem estar atentos a essas questões, sempre avaliando as situações pelas quais seus pacientes passam pois eles trazem vivencias. Porém, os terapeutas interpretam de uma outra forma, individualizando o processo psicossocial”, concluiu.



– CRP PELO INTERIOR –