15 out Saúde pública: de que profissional precisamos?
O primeiro debate do Seminário Mineiro de Psicologia na Saúde Pública abordou o tema “Saúde pública: de que profissional precisamos?”. Contou com os convidados Eduardo Passos, psicólogo, doutor em Psicologia, professor titular do Departamento de Psicologia da Universidade Federal Fluminense (UFF); Gregório Baremblitt, médico, livre docente de psiquiatria da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Nacional de Buenos Aires e membro honorífico da Fundação Gregorio Baremblitt de Uberaba; e Marta Elizabeth de Souza, psicóloga, mestre em Saúde Mental, coordenadora estadual de Saúde Mental de Minas Gerais, militante da Luta Antimanicomial.
Segundo a conselheira e integrante da comissão organizadora do evento, Odila Braga, que também coordenou a mesa, a escolha dos convidados para a primeira atividade se justificou por se tratar de pessoas que poderiam apontar caminhos e responder a pergunta “de que profissionais precisamos”.
Marta Elizabeth então iniciou a fase de exposições fazendo um registro histórico da saúde no Brasil, como ela reflete no processo de organização do Estado e concluiu com a formação do Sistema Único de Saúde (SUS). “Quando o SUS foi criado havia uma desassistência vigente no campo, no interior, nas cidades. Os movimentos sociais comunitários buscavam e a reivindicavam a criação de um sistema de saúde universalista para o Brasil. Era o movimento chamado de reforma sanitária. Nós, psicólogos, lutamos para entrar no SUS, que se chamava Ações Integradas de Saúde, pois haviam apenas médicos e um corpo da enfermagem (técnicos, atendentes). Foi por meio de um concurso que os psicólogos e a assistência social puderam entrar”, lembrou a psicóloga.
Segundo ela, nesta fase inicial o trabalho do psicólogo era muito restrito e superficial. Não havia a conversa, a escuta. “Nesse momento então foi instituída a luta antimanicomial com uma rede de serviço que pressupunha muitas questões, inclusive a corresponsabilização da equipe com a comunidade”, pontuou concluindo que o grande desafio do SUS é ter profissionais que promovam uma parceria com os usuários e com a família.
Na sequência se apresentou o professor Eduardo Passos, que abordou as contribuições da psicologia para a saúde pública e fez a provocação sobre o que se quer da formação desse profissional com atitude e ética no mundo contemporâneo. Ele disse que o psicólogo é o tecnólogo da crise. “Não experimentamos um paradigma na psicologia. O que existe é a convivência de diferentes sentidos para o que seja esse nosso ofício. Somos elaboradores de experiências críticas. Temos que nos haver com o grande desafio que é a construção do comum na diversidade. A potência do nosso ofício é a crítica”, alertou.
Diante da aposta “redemocratizante” do SUS, disse Passos, o psicólogo deve re-situar seu compromisso social e re-significar seu papel face ao perigo do autoritarismo nas práticas de saúde. “Esse autoritarismo é um centripetismo. É efeito de um centro de saber e de poder que se homologa no direito de legislar sobre tudo de forma vertical e autoritária. A ideia é pensar uma atitude crítica, um sistema que se redemocratiza cotidianamente no campo da saúde a partir de uma lógica acêntrica. A ideia é pensar na contribuição do psicólogo na saúde pública numa contribuição de rede”, afirmou dizendo ainda que o mandato social do psicólogo é trabalhar com o reposicionamento subjetivo dos trabalhadores e usuários implicados no processo de produção de saúde por meio do protagonismo e da co-responsabilidade.
Eduardo Passos encerrou sua apresentação dando o que ele chamou de pistas para o trabalho do psicólogo no SUS e no fomento das políticas públicas de saúde: temos que utilizar o conceito de transversalidade como diretriz de um modo de fazer de lógica acêntrica, rizomática para as práticas de produção de saúde. Precisamos entender que a tarefa é clinico-política de tríplice inclusão, ou seja, colocar diferentes atores na lateralidade provocando o efeito crítico, incluir a crise com os analisadores institucionais e incluir os coletivos, os chamados não-incluídos.
Para encerrar a fase de exposições da primeira mesa do Seminário, Odila Braga convidou o médico Gregório Baremblitt. Ele contextualizou as diversas situações que estão ocorrendo no planeta – conflitos ideológicos e religiosos, crises econômicas, vulnerabilidade dos refugiados sírios, precariedade na saúde, entre outros – as quais ele classificou como guerras. “Vejam que o Brasil é a oitava economia do mundo, mas está na 45ª posição no quesito distribuição de renda. Isso é uma guerra. O SUS é uma grande conquista. Mas o ministro de Saúde diz que faltam médicos no Brasil. Isso é uma guerra. Creio que a missão principal da educação, da segurança, da saúde, nesse país passa fundamentalmente por uma aliança entre profissionais. A função do especialista profissional de qualquer área é conspirar com o autêntico detentor da potência, que é o povo”, concluiu ele.