Violência contra a mulher: um direito não conquistado

Engana-se quem alega que a violência contra a mulher é uma questão já superada no Brasil. Não é o que mostram estudos recentes realizados no país. Seis em cada dez brasileiros conhecem alguma mulher que foi vítima de violência doméstica, segundo a pesquisa “Percepções sobre a Violência Doméstica contra a Mulher no Brasil”, realizada pelo Instituto Avon / Ipsos, em 2011. Também não é o que afirma quem trabalha com as políticas públicas voltadas para as mulheres.

A psicóloga judicial do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG), Maria Cristina Leão, que atua na equipe multidisciplinar no julgamento de processos da Lei Maria da Penha (Lei 11340/06), questiona os caminhos legais que as mulheres tem que percorrer para serem atendidas pela lei. Como exemplo, Cristina cita as mulheres que são remetidas à Vara de Família, quando precisam que as medidas de Lei Maria da Penha sejam estendidas a seus filhos. “Não precisaria remeter para essa Vara, mas o ônus de ter que ir lá, correr atrás do defensor, isso recai sobre a mulher”, critica a psicóloga. A crítica aconteceu durante o terceiro dia de debates da Semana da(o) Psicóloga(o), em 21 de agosto, Belo Horizonte.

Com o tema “Violência contra a mulher: um direito não conquistado”, além da presença de Maria Cristina, a mesa contou com a participação da presidente do Conselho Estadual da Mulher e representante da Rede Feminista de Saúde, Neusa Melo; da especialista em Saúde da Família e integrante da coordenação nacional da Marcha Mundial das Mulheres, Bernadate Monteiro; com a coordenação da psicóloga e conselheira do XIII Plenário do CRP-MG, Marisa Sanabria.

Cristina problematiza a conquista do direito através da Lei Maria da Penha, a qual vem com um ônus para as mulheres, quando precisam garantir o que está estabelecido. “Nós, que estamos na ponta atendendo as mulheres, não suportamos mais essa retórica. Não suportamos participar de debates em que os problemas reais não são colocados”, desabafa. Ela reforça que a luta para que as mulheres sejam efetivamente atendidas pela lei ainda é grande. “Estamos muito longe da superação desse problema”.

A presidente do Conselho Estadual da Mulher, Neusa Melo, acredita que toda discussão em torno da violência contra a mulher é uma possibilidade a mais nesse debate, que é contínuo. Durante sua fala, Neusa destacou a importância da criação da Lei Maria da Penha, que em 2013 completou 7 anos, elencando os acúmulos alcançados. “A Lei Maria da Penha vem trazer à luz a violência doméstica como um fenômeno terrível, vem trazer a realidade das mulheres que vivem em situação de violência e vem obrigar o Estado a assumir a responsabilidade no combate da violência”, explica.

Neusa Melo conta que a lei tem três dimensões, cada uma com seu significado no debate da violência, são elas: educativa, protetiva e punitiva. Melo alerta para o discurso de que a dimensão educativa seja a mais importante das três. “Quando falamos que a educação é a dimensão mais importante da lei, estamos tirando ou diminuindo a responsabilidade do judiciário de agilizar processos e de aplicar as medidas que a ela garante”, afirma. Neusa ainda discutiu o investimento do Estado, alegando que os recursos para capacitação e educação são infinitamente menores do que para punição e aparato de segurança.

A integrante da Marcha Mundial das Mulheres, Bernadete Monteiro, trouxe o debate do movimento feminista, tratando das raízes da violência contra a mulher na sociedade. Bernadete apontou a violência como o principal instrumento de manutenção da dominação das mulheres e explicou que a sociedade se organiza através do capitalismo e do patriarcado, aliados ao racismo. Ela reforçou que a violência atinge as mulheres de todas as classes, religiões e gerações, mas recai com mais peso sob aquelas que estão em situação vulnerável. “Mulheres negras e pobres são as mais atingidas”, afirmou.

Bernadete elencou os tipos de violência, entre elas a doméstica, a sexual e a pública, e chamou atenção para a banalização e a naturalização disso. Segundo a militante do movimento feminista, a superação da violência passa pelas ações de políticas públicas, mas também pela organização em movimentos sociais. “As saídas para combater a violência são saídas coletivas, de lutas permanentes, através da organização e protagonismo das mulheres”, conclui.

Durante a atividade, o CRP-MG prestou homenagem ao Fórum Mineiro de Direitos Humanos,representado por Egídia Almeida, pelo seu destaque na luta empreendidas nesse campo em Minas Gerais.

Veja AQUI as fotos do debate “Violência contra a mulher: um direito não conquistado”.



– CRP PELO INTERIOR –